Meu negócio está crescendo, e agora?

Alexandre Liuzzi (mentor do Quintessa), Sandra Nalli (Escola do Mecânico), Anna de Souza Aranha (diretora do Quintessa), André Biselli (Courrieros) e Marcos del Valle (mentor do Quintessa). Fotos: Divulgação

Quintessa promoveu a segunda edição do encontro “Meu negócio está crescendo, e agora?” para debater com empreendedores e mentores os principais dilemas que os negócios de impacto enfrentam: o momento certo de trazer escala ou a importância de estruturar a gestão; a formação do time ou o equilíbrio entre produto e vendas.

No dia a dia dos empreendedores, não há certo ou errado, nem manual de orientação. Os critérios usados para as decisões que se apresentam nem sempre são convencionais. O que não falta é gente querendo conversar sobre os principais dilemas que os negócios de impacto enfrentam. Meu negócio está crescendo, e agora? foi o tema do encontro que o Quintessa realizou no dia 4 de julho, no Civi-Co e que reuniu dois empreendedores – Sandra Nalli, da Escola do Mecânico, e André Biselli, da Courrieros – e dois mentores do Quintessa – Alexandre Liuzzi (MAR Ventures) e Marcos del Valle (Agência Jussi) – que também compartilharam suas trajetórias como empreendedores.

 Todos os empreendedores vivenciam as fases de validação, de estruturação e de olhar para a escala. Mas qual é o momento de encarar o crescimento e enfrentar o risco? Essa foi a primeira questão colocada aos participantes por Anna de Souza Aranha, diretora do Quintessa e que fez a mediação do painel.


 “Optamos por criar um sistema de gestão compartilhada com parceiros/investidores. Foi uma tomada de decisão muito complexa.”

Sandra Nalli (Escola do Mecânico)


 

Sandra Nalli, ex-executiva de uma empresa do setor automotivo, contou que a Escola do Mecânico nasceu de um projeto social em 2011 e guarda uma pegada de impacto. Diante da falta de mão de obra qualificada para o segmento de reparação automotiva e o desejo de impactar mais pessoas com a geração de emprego e renda, a empreendedora sentiu, em 2014, que era hora de escalar o negócio. “Tínhamos uma demanda de pessoas de outros estados querendo comprar os nossos serviços ou pedindo que nós treinássemos equipes. Naquele momento, não tínhamos recursos financeiros para crescer e ficamos entre buscar um investidor e criar escolas próprias ou franquias. Optamos por criar um sistema de gestão compartilhada com parceiros/investidores. Foi uma tomada de decisão muito complexa. Uma coisa é ofertar um serviço que você faz bem; outra é vender franquias, um negócio. Eu sei fazer bem treinamentos para mecânicos. Vender franquias é mais complicado. Até a sétima unidade passamos por uma série de ajustes. Hoje estamos mais afinados com o processo e conseguimos crescer de forma mais acelerada”, explica Sandra.

A Courrieros começou em 2012 como uma empresa de logística urbana. No início, alocava ciclistas para grandes empresas, todos em regime CLT. Cresceu nesse modelo piloto, mas logo os empreendedores perceberam que a conta não fechava. De mudança em mudança, chegaram ao e-commerce, patamar que garantiu um crescimento sustentável. “O crescimento nem sempre é verdadeiro, pode ser uma bolha. No final de 2017, vivemos bem forte essa bolha com um cliente específico e números fantásticos. Quase quebramos. Tivemos que discutir muito para entender melhor o mercado e fomos nos ajustando até que, no começo do ano passado, chegamos a um modelo que funciona. Nós que trabalhamos com negócio de impacto, somos muito convencidos do que fazemos, achamos que vamos deixar um mundo melhor, mas as pessoas não vão entender isso. Se o seu produto simplesmente substituir um outro, não é natural que se troque moto por bike”, comenta André Biselli.


“O maior fator limitante é a capacidade de investir em algo realmente diferenciado, mas se você tem demanda real pelo seu produto, a meta é provar que existe demanda e crescer”. 

Alexandre Liuzzi (MAR Ventures)


 

“Focar no desenvolvimento da tecnologia no começo, criar um produto de qualidade e o melhor serviço para o cliente foi uma opção para nós. Mas na primeira interação com fundos, vinha o questionamento: qual vai ser o crescimento. Então, se você está construindo um projeto que vai necessitar de aporte de capital, a primeira coisa que conta é o potencial de crescimento. É mais importante crescer estruturando a empresa pelo caminho, mesmo que eu não tenha a solução 100% pronta agora. A realidade de venture capital é diferente. Tem que crescer a qualquer custo. O maior fator limitante é a capacidade de investir em algo realmente diferenciado, mas se você tem demanda real pelo seu produto, a meta é provar que existe demanda e crescer”, destaca Alexandre Liuzzi, da MAR Ventures.

Para Marcos del Valle, da Agência Jussi, ser eficiente na alocação dos recursos é um grande aprendizado, principalmente para os negócios que estão começando. “Uma agência é um negócio diferente que precisa de capital humano para crescer. A nossa vinculação com o dinheiro é muito peculiar. Existe um modelo por trás do nosso crescimento que nos mantém saudáveis”, diz Marcos.

Aumentar vendas ou refinar produto? Na prática, onde está o limite do feito e do perfeito? Estou perdendo tempo demais em aperfeiçoar produtos e serviços? Ou tenho que vender e depois correr para conseguir entregar aquilo que eu vendi? Anna de Souza Aranha, mediadora do painel, solicitou aos participantes histórias mais específicas, de “passos maiores do que as pernas” e de aprendizados.


“Pegamos um cliente gigantesco que foi realmente um passo maior do que as pernas. A situação ficou desesperadora, mas deu tudo certo.”

André Biselli (Courrieros)


 

O modelo de negócio que a Courrieros desenvolveu conta com bastante tecnologia embarcada e não tem nada a ver com o do ciclista tradicional, que faz poucas entregas (em média 15 a 20 pedidos em um dia ótimo), com uma mochila. A empresa adota uma bicicleta chamada cargueiro, que consegue transportar 70 a 80 pedidos, pedalando menos em menos tempo, com a otimização de rotas. “Esse projeto surgiu há pouco mais de um ano e adotamos a estratégia de “vamos vender que depois a gente entrega”, diz André Biselli. “Descobrimos um fabricante dessas bicicletas no Rio Grande do Sul, que não funcionou. As bikes quebraram em menos de um mês porque não foram feitas para essa carga de trabalho. Desenvolvemos outro fornecedor, a Black Friday chegando e aconteceu a greve dos caminhoneiros. Foi uma data especial para nós, porque as bikes não pararam. Pegamos um cliente gigantesco que foi realmente um passo maior do que as pernas. A situação ficou desesperadora, mas deu tudo certo”, conta André.

Empreendedores e mentores debatem os principais dilemas enfrentados pelos negócios de impacto

Para Sandra Nalli, a experiência de passar a vender o negócio foi uma experiência e tanto. “Nós não estávamos preparados para isso porque tudo passou a ser feito pela mesma equipe que cuidava das duas escolas próprias – eu e mais cinco pessoas. Foi muito arriscado. As três primeiras escolas vendemos para amigos e conseguimos fazer um volume financeiro, além de emplacar uma franqueadora. Foi um grande aprendizado e eu costumo dizer que demos três saltos: em 2015, começamos a operação de franquia e montamos três unidades em 2016; em 2017, pulamos para nove unidades e, em 2018, fechamos o ano com 22. Agora no primeiro trimestre de 2019 abrimos mais 10 e a nossa meta até o final do ano é de abertura de 50 escolas”, conta Sandra. Hoje a Escola do Mecânico conta com uma estrutura de 16 pessoas na franqueadora e consegue visualizar como o negócio se tornou rentável.

Marcos del Valle, da Jussi, conhece esse cenário muito bem. “Já perdi a conta das vezes que me perguntaram se sabíamos fazer ´X´. Se nós não sabíamos, descobríamos como fazer. No meu universo, somos constantemente desafiados para resolver problemas novos. No final, sempre entregamos, virando várias noites”, conta.

Meu negócio está crescendo, e agora? Vai dar medo, mas tem que acelerar!

Focado em desenvolver plataformas tecnológicas de produtos financeiros, que demandam tempo e investimento, Alexandre Liuzzi, da MAR Ventures, já vivenciou situações em que tinha um produto pronto, mas faltou preparação e aprendizado para vendê-lo. “Para desenvolver tecnologia é preciso tempo. Você até pode fazer um protótipo, mas dependendo da tecnologia que você está vendendo para o cliente, os produtos podem consumir mais de um ano. Quando começamos a lidar com o mercado de crédito, percebemos que havia muita oportunidade para democratizar o acesso ao crédito. Investimos grande parte dos recursos em tecnologia e desenvolvemos um algoritmo que possibilitaria usar inteligência artificial. Tudo para melhorar a assertividade da plataforma que era destinada a pequenas e médias empresas. Em paralelo, criamos uma outra empresa no segmento de crédito que vendia produtos por meio de um call center, com três pessoas no time de tecnologia. O nosso tinha oito pessoas e estávamos tão focados em desenvolver uma plataforma completa que não imaginamos como crescer. Nós nos deparamos com os desafios do crescimento um ano depois e de ter investido mais de R$ 2 milhões. O caso da Bee foi diferente: crescemos primeiro e fomos desenvolver um produto depois, aprimorando a plataforma, porque para fazer o cliente sair do que ele faz hoje, é preciso mostrar uma solução que melhore a vida dele 10 vezes”, explica Alexandre.

Anna de Souza Aranha, do Quintessa, destacou como as histórias trazidas pelos integrantes do painel estavam conectadas com um olhar para o cliente, analisando o momento de crescer e de estruturar cada negócio. ”Nos comentários, noto a preocupação de verificar se é uma dor recorrente do cliente, de olhar para dentro de casa, analisar para onde o mercado está indo e para onde os concorrentes estão indo, que tipo demanda os clientes estão apontando. Temos então dois tipos de encaixes de negócios diferentes: um seria o encaixe da solução com a necessidade; e o outro entrar no mercado direto. O balanço é dinâmico – tenho o produto perfeito, mas não sei como vender. E, na hora de vender, posso descobrir que não era tão perfeito assim. Ou desenvolver menos o produto, que vai solucionar o problema do cliente de uma forma relevante”, analisou a diretora do Quintessa.

 Experiências e aprendizados

  • Equilibrar o foco com as oportunidades que aparecem; o que é oportunidade e o que é desvio de atenção, as ondas que devem ser surfadas.
  • Não é possível desenvolver três ideias ao mesmo tempo.
  • Foco é tudo – em uma startup, existe flexibilidade de testar diferentes canais de crescimento.
  • Aprender a falar “não” para muitas coisas.
  • Por meio do foco, é que você consegue entregar a melhor experiência para o cliente.
  • O desafio está no micro, no dia a dia; reuniões erradas só servem para perder tempo.
  • A cabeça do empreendedor é fértil e vê oportunidade em tudo; ele se apaixona por sonhar.
  • Trazer aliados para o time, pessoas completamente diferentes de você.
  • Focar nas pessoas – nesse momento de crescimento é muito importante estar cercado de pessoas excepcionais. Essa pessoa não vai deixar você perder a mão, vai assumir coisas que você não pode fazer, funções que você vai delegar.
  • Quando passa de 100 pessoas muda tudo – você tem que repensar a estrutura.
  • Ter clareza dos objetivos é muito importante, saber onde você quer chegar.
  • Ouvir muito as pessoas antes de tomar decisões.
  • Reciclar sonhos – para quem empreende é obrigatório, descobrir qual é a chama que faz você continuar.
  • Cada cliente me desafia a pensar de forma diferente.
  • Meu negócio está crescendo, e agora? Vai dar medo, mas tem que acelerar!