Projeto Encauchados inova na produção da borracha e garante a inclusão social e a conservação da floresta

Combinando conhecimento indígena tradicional de manipulação do látex com tecnologias aprimoradas e adaptadas para uso no rústico ambiente da floresta, os Encauchados de Vegetais da Amazônia são produtos prontos para o mercado, fabricados pelos próprios extrativistas e comercializados diretamente pelas organizações de base. A iniciativa pioneira ajuda os seringueiros a agregar valor aos produtos e a reconstruir a economia tradicional local.

Produzida e comercializada pelo Poloprobio (Polo de Proteção da Biodiversidade e Uso Sustentável dos Recursos Naturais), em Castanhal (PA), a linha Encauchados de vegetais da Amazônia  combina conhecimento indígena tradicional de manipulação do látex com tecnologias aprimoradas e adaptadas para uso no rústico ambiente da floresta. Apoiada em tecnologia social que garante inclusão das comunidades extrativistas e conservação da biodiversidade, com a floresta em pé, a linha é diversificada e de design arrojado, feita com borracha natural produzida em seringais nativos por comunidades indígenas e de caboclos, a partir da mistura do látex com fibras vegetais.

Encauchados é o nome da borracha natural produzida em seringais nativos por comunidades indígenas e tradicionais da Amazônia. Entre os produtos da linha produzida pelo Poloprobio estão calçados, bolsas, jogos americanos e acessórios, além de cachepôs e sousplats (porta-pratos), tudo inspirado nos desenhos, formas, texturas e cores das folhas da Floresta Amazônica, como a capeba, a vitória-régia e a apuí, entre outras.

Seringueiro colhendo o látex

A tecnologia foi desenvolvida pelo pesquisador Francisco Samonek, da Universidade Federal do Acre, junto a indígenas e seringueiros do município Vila Acre (PA). Ele começou a estudar um novo método de processamento do látex de borracha, sem o uso de eletricidade e maquinaria da década de 1980. Depois de juntar pesquisa científica com o conhecimento empírico dos seringueiros, Samonek foi capaz de desenvolver um tecido emborrachado que evitava a cura por fumaça. O látex foi simplesmente aplicado ao tecido industrializado e deixado secar naturalmente ao sol. Posteriormente, fibras vegetais coletadas localmente foram adicionadas ao látex, o que possibilitou a eliminação do uso do tecido industrializado. As fibras e os corantes vegetais são colhidos por meio de manejo comunitário, seletivo e de baixo impacto.

A tecnologia foi replicada em outros locais da Amazônia, estimulando a reativação de seringais nativos no Acre, Amazonas, Rondônia e Pará, somando 17 pequenas unidades de produção coletivas ou familiares. A iniciativa pioneira está ajudando a reconstruir a economia tradicional local, pois os encauchados permitem aos seringueiros, pela primeira vez na história, agregar valor ao seu produto, a borracha, e sobreviverem de sua atividade tradicional. A nova técnica permitiu a criação de artefatos de todas as formas e tamanhos.

Porta-pratos feitos com folha de capeba

“A mata continua em pé e os seus moradores não precisam migrar para tentar subempregos nas cidades ou para atividades como a agropecuária e o desmatamento ilegal. Em Castanhal, a atividade envolve 1.500 pessoas, que recebem uma renda de R$ 1.200 por mês, trabalhando três horas por dia. É uma complementação da renda porque o processamento do açaí, por exemplo, é realizado por três meses do ano”, explica Samonek.

O projeto conseguiu reverter as consequências da falência do modelo convencional de produção da borracha. Praticado desde o início da era industrial, esse modelo tornou-se obsoleto e insustentável para os extrativistas da Amazônia. Depois do ciclo da borracha, as comunidades e os seringais ficaram abandonados. Veio a substituição das florestas pelo pasto e pela soja, que levou à destruição de milhares de hectares de seringais nativos com toda sua biodiversidade ainda não estudada. Com pesquisa, desenvolvimento e inovação, os encauchados de vegetais são produtos prontos para o mercado, fabricados pelos próprios extrativistas e colocados no mercado diretamente pelas organizações de base.

 Desenvolvimento comunitário

O Poloprobio é uma instituição que trabalha na área ambiental com ações que aliam desenvolvimento comunitário, inovação e cultura. O foco é o fortalecimento de comunidades tradicionais e indígenas a partir de processos que dão ao produtor acesso à tecnologia e o direito de empreender e fabricar produtos prontos com maior valor agregado, ao invés de vender matéria-prima para a indústria. O grande objetivo é estimular os moradores da Amazônia a fazer uso de recursos naturais de forma racional.

Entre os grupos envolvidos com a produção dos encauchados estão os moradores de terras indígenas da Amazônia Legal como, por exemplo, as terras Katukina/kaninawá de Nova Olinda no município de Feijó no Acre. A sede principal do instituto, porém, fica em Castanhal, no Pará.

Hoje, a Rede Encauchados conta com o apoio da Fundação Banco do Brasil/BNDES e da “Redes ECOFORTE de Agroecologia”, consolidando-se como um empreendimento que gera trabalho, renda, empoderamento e inclusão socioeconômica nesses seringais reativados, o que significa a preservação de grandes áreas de mata nativa.

A iniciativa, premiada em 2008 pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, está gerando melhor renda e qualidade de vida para o povo da floresta, ao mesmo tempo em que evita o desmatamento pela expansão do gado e da lavoura. O projeto é financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), FINEP (Agência Brasileira de Inovação) e pelo Sebrae (uma agência de apoio a pequenos negócios.

Atualmente, o Poloprobio possui parceria com a Universidade Federal do Acre – UFAC/CFCH; com a Universidade Federal do Pará – UFPA/NAEA; com a Fundação Nacional do Índio –FUNAI; com a Fundação Banco do Brasil] e com o Instituto Chico Mendes para a Conservação da Biodiversidade –ICMBio, entre outros. Tem como apoiadores-financiadores, o Programa Desenvolvimento & Cidadania Petrobras, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, o Banco da Amazônia, o SEBRAE, o Programa Biodiversidade Brasil – Itália, a Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP.

Em novembro do ano passado, o projeto Encauchados foi finalista da Chamada de Negócios  realizada pela Plataforma de Parceiros pela Amazônia (PPA), coordenada pelo Idesam em parceria com a  USAID (US Agency for International Development) e CIAT (International Center for Tropical Agriculture). Foi selecionado entre 81 inscritos para se apresentar no 1º Fórum de Investimentos de Impacto e Negócios Sustentáveis na Amazônia (FIINSA), realizado em Manaus (AM), participar da Rodada de Investimentos e do Programa de Aceleração e Incubação da PPA.