Investimento de impacto em agricultura climate-smart: mapeamento inspira novos investidores

Estudo analisa 50 iniciativas e seleciona seis casos mais significativos nos biomas Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado, baseados em sistemas voltados à redução e mitigação de mudanças climáticas e ao engajamento de pequenos produtores

Como ampliar os investimentos de impacto em agricultura climate-smart? Para motivar essa expansão, a Alimi Impact Ventures, com o apoio da Rabobank Foundation, realizou o Mapeamento sobre Investimento de Impacto em Agricultura Climate-Smart no Brasil, centrado especialmente nos biomas Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado. O estudo qualitativo analisou 50 iniciativas de agricultura sustentável, baseadas em sistemas voltados à redução e mitigação de mudanças climáticas e ao engajamento de pequenos produtores. Seis casos mais significativos foram selecionados e analisados, com o objetivo de inspirar novos investimentos nessa área.

Ao abrir o evento de lançamento do Mapeamento, no dia 26 de julho, em São Paulo, Eva Teekens, responsável por Programas para a Tanzânia, Etiópia, África Ocidental e Brasil na Fundação Rabobank, disse que a tarefa de ampliar a presença da organização no Brasil foi, a princípio, “intimidante”. A Fundação é o pilar da política de responsabilidade socioambiental do Grupo Rabobank, líder global em serviços de financiamento para alimentação, agrofinanciamento e sustentabilidade orientada. “Não sabia por onde começar. Mas esses últimos meses têm sido extremamente gratificantes. Tive o prazer de visitar algumas iniciativas e conhecer esse país, que é imenso e muito bonito. Minha perspectiva mudou. Investimentos em agroflorestas podem dar retorno em curto espaço de tempo. Temos agora mais informação para realizar investimentos, mas sabemos que será uma gota. Esperamos que esse estudo seja um catalisador para que outros investidores sociais se juntem a essas iniciativas. Uma coisa é evidente: se nós queremos alimentar a população daqui a 50 ou 100 anos, temos que cuidar do agricultor familiar e ter foco em uma produção sustentável que preserve e restabeleça o equilíbrio ambiental”, afirma Eva.

Segundo Angélica Rotondaro, co-fundadora da Alimi Impact Ventures, laboratório de gestão que tem o objetivo de promover escalabilidade em investimento sustentável no Brasil, o levantamento identificou iniciativas, projetos e negócios que estão sendo desenvolvidos de maneira profissional, com potencial de crescimento e que são replicáveis. “Vislumbramos a oportunidade de conectar o investimento em agricultura sustentável com retorno financeiro e impacto de redução e mitigação de mudança climática. Queríamos também resgatar a reputação do Brasil para o investimento estrangeiro. Mostrar que tem gente séria no Brasil, desenvolvendo iniciativas interessantes, que estão fora do radar”, explica Angélica Rotondaro.

Embora seja difícil demarcar as fronteiras do investimento de impacto em agricultura agro-smart associada ao engajamento de pequenos produtores, o mapeamento estima que o total investido foi de US$ 360,9 milhões entre 2015 e 2017, nos biomas Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica, quantia que poderia ser bem mais elevada.

O evento teve apresentações de investidores e empreendedores como Nicolas Landolt (EcoAxial), Roberto Pini (Floresta Viva) e Francisco Jardim (SP Ventures), e de iniciativas que oferecem instrumentos financeiros inovadores como Veículo com Cota Subordinada (Fernanda Camargo, da Wright Capital), Fundo de Colateral para Pecuária-Floresta (Anna Horta, da TNC), Modelo Projeto Verena (Rachel Biderman, WRI) e CRA-Verde (Fabrício de Campos, da WWF).

Em duas sessões de pitching, foram apresentados os cases Idesam / Amazon-Pec, por Mariano Cenamo; APOMS / Hub Empreendedorismo Agroecologia no Cerrado, por Olácio Komori; Futuro Florestal / Projeto Tupi, Sul da Bahia, por Rodrigo Ciriello; SAF Socioambiental / Kaeté Investimentos, por Luis Fernando Laranja; projeto Rizoma, por Marcelo Marzola; e Floresta Urbana / Impact Hub, por João Victor Cayres.

Metodologia e critérios de seleção

O conceito de agricultura climate-smart traz uma perspectiva sistêmica e engloba as práticas de uso sustentável do solo, o engajamento dos pequenos agricultores, a agropecuária integrada ou a pecuária-floresta, a resiliência às mudanças climáticas e outros aspectos. O termo foi proposto pela FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) e pelo Fórum Econômico Mundial (WEF).

Para analisar as 50 iniciativas brasileiras alinhadas com modelos de agricultura climate-smart , o mapeamento desenvolveu indicadores com base nos principais acordos ambientais internacionais – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), Acordo de Paris, Declaração Florestal de Nova York e Soft Commodities Compact. Os critérios preliminares de seleção exigiam que as iniciativas contemplassem sistemas de agrofloresta, diferentes arranjos de iLPF (integração lavoura-pecuária-floresta), o envolvimento com pequenos produtores, retorno financeiro (conexão com o mercado) e cadeias produtivas de alimentos. Desse processo, resultaram as seis iniciativas mais significativas, que foram analisadas e reportadas como estudo de caso, com trabalho de campo.

A percepção do risco associado dos negócios mapeados recebeu especial atenção nas sessões de collaboratory, que envolveram diversos stakeholders. Cinco categorias de riscos se destacaram: riscos financeiros e de negócios; riscos ambientais e de mudança climática; riscos de infraestrutura e da cadeia de fornecimento; riscos políticos, legais e de governança; e o risco “H” (capital humano). O relatório traz os componentes de cada categoria, bem como suas estratégias de mitigação.

Os seis casos que receberam as maiores pontuações nos rankings construídos pela aplicação dos indicadores estão relatados como estudos de caso na plataforma Climate Smart Agriculture Case Studies Series, com relatórios e análises das respectivas cadeias de valor, fluxos de capital financeiro e impactos gerados.

Série de estudos de caso em agricultura climate-smart analisadas pelo mapeamento

Amazon Pec

O Amazon Pec (Idesam – Apuí) é um projeto desenvolvido para fornecer empréstimos e assistência técnica para pecuaristas de pequeno e médio porte. O objetivo principal é fornecer os meios para que convertam pastos degradados em sistemas de pecuária silvipastoril (que integram lavoura, pecuária e floresta) altamente produtivos. Buscam investimentos para aumentar dos sete produtores atuais para 120 nos próximos três anos.

CAMTA – Sistema Agroflorestal Amazônico e Adaptação de Mercado

A CAMTA (Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu) é uma cooperativa de imigrantes japoneses que chegou ao estado do Pará em 1929. Os produtores adaptaram o sistema agroflorestal às características do bioma Amazônia e ampliaram seu portfólio de produtos para alcançar os mercados local, nacional e internacional. Produzem pimentas, sucos e polpas de cupuaçu e maracujá.

APOMS

A Rede de Agroecologia da APOMS (Associação de Produtores Orgânicos do Mato Grosso do Sul) é formada por pequenos agricultores familiares (170 famílias), assentados da reforma agrária, populações indígenas, quilombolas e jovens rurais para produzir e comercializar produtos orgânicos, sob os princípios da agroecologia, culturas orgânicas e comércio justo. Foi criada uma central de comercialização dos produtos e uma cooperativa de crédito.

Floresta Viva & Fundo Moringa

A Floresta Viva é uma empresa brasileira produtora de alimentos e produtos de madeira, que segue os princípios do sistema agroflorestal. Permite a conservação do solo e privilegia o pequeno produtor. A empresa foi fundada pelo investimento conjunto de investidores privados brasileiros – principalmente os Irmãos Pini e Fernando Meireles – e pelo fundo de investimento de impacto Moringa, com sede na França.

Fundo EcoEnterprises & Sambazon

Em 2017, a Sambazon foi nomeada a maior vendedora global de frutas de açaí em um mercado atual com um volume de 300 mil toneladas de frutas por ano, que deve crescer para 800 mil toneladas em vendas por ano até 2026. Nos anos em que o açaí ainda não era conhecido no mercado internacional, o Fundo EcoEnterprises desempenhou um papel essencial ao fornecer capital inicial na forma de parcelas de dívida e patrimônio para ajudar a estabelecer a primeira instalação da Sambazon. Quando Ryan Black, Jeremy Black e Edmund Nichols decidiram abrir a empresa, havia uma necessidade de capital de fronteira para um modelo de negócio ainda não comprovado.

EcoAxial & Instituto Estrela

O Instituto Estrela é uma associação de microcrédito, reconhecida como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), em 2005. Foi criada com a missão de superar uma lacuna no acesso das pequenas empresas do semiárido brasileiro ao crédito para capital de giro. Fornece dois tipos de linhas de crédito aos pequenos agricultores. O primeiro é direcionado para a configuração da infraestrutura. O segundo é formado por um empréstimo de ciclo curto para capital de giro, que está alinhado com o ciclo de plantio de alface orgânico e associado à entrega do produto para a empresa Rio de Una.